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Por que a projeção de baixa inflação ou deflação na China preocupa analistas
Queda ou desaceleração de preços é sinal de desaceleração econômica no gigante asiático, segundo especialistas
Por Ricardo Leopoldo, Eduardo Laguna e Gustavo Boldrini, do Broadcast
São Paulo, 31/01/2024 - A expectativa de que o consumo na China será moderado neste ano, devido à longa crise no setor de imóveis, deve levar o país a uma inflação baixa em 2024, ou até mesmo à continuidade da deflação registrada em 2023, segundo analistas.
Embora este cenário para a China requeira um conjunto amplo de medidas de política fiscal e monetária para estimular o nível de atividade econômica por parte do governo, economistas entrevistados pelo Broadcast baseados em Hong Kong e Xangai acreditam que tais ações oficiais não serão tão abrangentes.
Eles estimam que o Produto Interno Bruto (PIB) da segunda maior economia do mundo neste ano deverá ter uma expansão ao redor de 4,5%, inferior à meta oficial de 5%, que poderá ser anunciada em março.
A deflação, ou seja, a queda média nos preços de uma economia é um sinal de desaceleração econômica. Afinal, se a taxa de investimento das empresas cai e as pessoas consomem menos, os preços gerais da economia tendem a cair.
Em 2023, a China registrou o maior período de deflação desde a crise dos países asiáticos em 1997-1998. O índice de preços ao consumidor (CPI, na sigla em inglês) atingiu a média de 0,2% no ano passado. A expectativa é de que a inflação poderá subir um pouco neste ano.
"Com a estabilização dos preços da carne de porco e a cotação média do barril do petróleo Brent em US$ 83 em 2024, o CPI poderá subir 0,9% neste ano", estima Grace Ng, economista sênior do banco JP Morgan. A meta de inflação no país é de 3,0%. "Há, contudo, riscos de continuidade da deflação se o consumo não apresentar uma retomada no curto prazo."
Por que a deflação na China preocupa?
Analisar a economia chinesa não é uma tarefa simples, já que muitas vezes a lógica que se aplica a outros países do Ocidente ou emergentes não é a mesma que funciona no gigante asiático. Em primeiro lugar, precisamos entender que a economia chinesa tem se baseado nas últimas décadas em fortes investimentos do Estado, que acabam se traduzindo em expansão massiva do PIB local. Ou seja: trata-se de uma economia focada no crescimento e na expansão. Seja por meio das empresas do país, seja por meio do consumo das famílias.
A deflação chinesa tem se espalhado pelo mundo, chegando até ao Brasil. Os produtos da China já são normalmente competitivos em termos de preços, mas ficaram ainda mais baratos, dificultando aumentos de preços dos concorrentes mundo afora. Por aqui, a China tornou-se uma força adicional à tendência de queda da inflação de bens de consumo, somando-se aos efeitos do crédito caro na demanda, do comportamento mais estável do câmbio e da normalização da oferta dos bens após a superação de gargalos de produção.
Conforme cálculo da Warren Investimentos, a inflação de bens industriais do Brasil - um grupo que abrange produtos duráveis e semiduráveis, além de materiais de construção - ficou em 1,09% em 2023, a menor taxa em cinco anos, sendo que os preços chegaram a cair, ou seja, marcaram deflação, em junho (-0,57%), setembro (-0,20%) e novembro (-0,54%). Ficaram mais baratos no Brasil, ao longo do ano passado, eletrodomésticos como geladeira, máquina de lavar roupa e TV, aparelhos eletrônicos como videogame e computador pessoal, e alguns itens de vestuário, como vestido e roupa infantil, além de pneus e bicicletas.
Na base dessa baixa de preços está a propensão dos chineses a gastar menos, sobretudo causa de incertezas com as perspectivas econômicas no país nos próximos anos. O cenário reflete a reestruturação do setor de construção de residências, segmento produtivo que responde por 20% do PIB do país. Cerca de 60% da renda das famílias na China depende dos preços dos imóveis. Em um período de baixa desses ativos, como ocorre atualmente, também recuam as compras dos consumidores de diversas mercadorias, como eletrodomésticos e móveis.
"O país está no meio de um ciclo de cinco anos pós-bolha de imóveis, que ainda deve durar mais três anos", afirmou Carlos Casanova, economista sênior para a Ásia do banco suíço Union Bancaire Privée (UBP).
Como as perspectivas chinesas mexem com a Bolsa brasileira?
O noticiário sobre a China tende a mexer com o Ibovespa, uma vez que a composição do índice de referência da B3 tem empresas intimamente ligadas à economia chinesa com um peso relevante. Com isso, além dos dados macroeconômicos do país, notícias sobre setores que demandam matéria-prima produzida por empresas brasileiras, como a indústria e a construção civil chinesa, podem fazer preço.
A ação ordinária da Vale (VALE3), que possui a maior participação dentro índice, tem forte correlação com a China, uma vez que o país asiático é o maior consumidor de minério de ferro do mundo. Os dados sobre a economia chinesa afetam a cotação da commodity, que por sua vez interfere no preço da ação da mineradora brasileira. A Vale tem a China como destino de metade de suas vendas anuais. Além dela, também podem se movimentar conforme a China as ações das siderúrgicas CSN (CSNA3), Gerdau (GGBR4) e Usiminas (USIM5).
Junto com o minério de ferro, outros produtos como soja, petróleo, carne bovina e celulose representam mais de 80% de todo o volume embarcado para a China por empresas brasileiras. Assim, também são ativos correlacionados com a China as produtoras de soja como SLC (SLCE3), Boa Safra (SOJA3), 3Tentos (TTEN3), BrasilAgro (AGRO3); as produtoras de proteína animal como JBS (JBSS3), Minerva (BEEF3), Marfrig (MRFG3) e BRF (BRFS3), e as exportadoras de papel e celulose Suzano (SUZB3) e Klabin (KLBN11).
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