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Palavra do Economista | O que esperar da economia nos próximos trimestres?

Publicado por: Análise BB

conteúdo de tipo Leitura7 minutos

Atualizado em

23/09/2024 às 14:24


Determinados momentos do ano são propícios para realizarmos planejamentos, ou mesmo revisitar planos que já estavam em andamento. Tendo isso em mente, a virada do primeiro para o segundo semestre de 2024 permite aos economistas fazerem algumas reflexões sobre o cenário macroeconômico. Ao revisitar o passado, mais especificamente o início deste ano, o mercado tinha uma expectativa mais clara e favorável sobre a principal variável financeira da economia, a taxa de juros. Grande parte do mercado financeiro apontava para o início da flexibilização monetária nas principais economias, em especial, nos Estados Unidos, ainda no primeiro semestre deste ano. Para o Brasil, a expectativa mediana de mercado medida pelo Focus apontava para a continuidade da flexibilização monetária até que a Selic alcançasse 9,0% a.a. ao final de 2024, caminhando posteriormente para 8,5% a.a. no fim de 2025.

Decorrido todo o primeiro semestre do ano, não se mostra trivial apontar para mudanças significativas nos fundamentos da economia doméstica. No entanto, quando observamos os movimentos de grandes variáveis, tais como taxa de câmbio e juros, é notório que o cenário se desenhou de maneira mais desafiadora, deixando a visão para os próximos trimestres mais nebulosa do que se imaginava há alguns meses atrás. Neste sentido, a virada de semestre se mostra uma boa oportunidade para revisitar a conjuntura econômica e rever a rota que a economia deverá seguir ao longo dos próximos trimestres.

Juros internacionais

Quando olhamos para a economia global, o maior evento esperado é o início da flexibilização monetária nos Estados Unidos. Ao longo do primeiro semestre houve uma forte expectativa de mercado para que o início do corte das Fed Funds (taxa básica norte-americana) se iniciasse já no primeiro trimestre do ano, com muitas apostas para o mês de março. Todavia, o forte ritmo do mercado de trabalho e a resiliência da atividade gerou fôlego adicional nos dados de inflação, que se mantiveram distantes da meta de 2,0% a.a., adiando o corte de juros. Posteriormente, as apostas para cortes de juros migraram para o segundo trimestre, mas novamente os dados revelados não convergiram na intensidade necessária para gerar conforto ao FED (Banco Central dos Estados Unidos), o que ocasionou nova frustração de boa parte do mercado. Mais recentemente, a última reunião de política monetária do BC americano mostrou que há uma divisão importante no comitê a respeito dos próximos passos na condução da política monetária, com oito membros apontando para dois cortes de juros este ano, sete membros com um único corte e quatro membros trabalhando com a hipótese de que não se deve iniciar o ciclo de corte em 2024, evidência de que a incerteza permanece elevada para o cenário de juros nos Estados Unidos até mesmo dentro do FED.

Por conta da dependência de dados e do discurso cauteloso dos membros do FOMC (Comitê de Política Monetária do FED), acredito que há uma menor probabilidade de que o ciclo de flexibilização por lá tenha início já no mês de setembro (atual aposta do mercado). Trabalho com dois cortes de juros este ano nos EUA, em novembro e dezembro, com a taxa dos Fed Funds em 5,0% (limite superior). Para 2025, espero por mais quatro cortes de 0,25 p.p., com a taxa terminando o ano em 4,0%.

De maneira detalhada, olhando para os dados de inflação, após um primeiro trimestre frustrante, a divulgação do CPI e PPI de maio abaixo do esperado alimentou expectativas de que o processo inflacionário tenha voltado para a tendência de convergência em direção à meta. Mas, como sinalizaram os próprios dirigentes em seus discursos, será necessário um maior conjunto de dados positivos para que se inicie a flexibilização monetária. Como salientou Jerome Powell (Presidente do FED) em suas falas recentes, desde o meio do ano passado os dados de inflação têm percorrido um “caminho acidentado”.

Leia também: O que tem a ver inflação com taxa de juros?

Mercado de câmbio

Entendo que esta configuração de cenário global - que conta ainda com um diferencial de crescimento e de política monetária a favor dos EUA - sinaliza que o dólar deve permanecer forte ao longo do ano, o que eleva o desafio para países emergentes, como é o caso do Brasil. No entanto, destaco que, além deste contexto internacional mais desafiador quando se pensa em câmbio, fatores domésticos também têm pesado sobre a trajetória da moeda, que recentemente testou patamares ao redor de R$/US$ 5,70. Para o restante do ano, no entanto, em virtude da expectativa de queda de juros nos EUA, arrefecimento (mesmo que parcial) das incertezas políticas e fiscais e um resultado robusto para o setor externo, avalio que há espaço para valorização cambial, levando nossa moeda para patamares ao redor de R$/US$ 5,20 no fim de 2024.

Cabe ressaltar que a recente desvalorização da moeda traz reflexos sobre uma extensa cadeia de valores, com impactos diretos e indiretos na formação dos preços, que se manifestam tanto no atacado (medido pelos IGPs) quanto no varejo (IPCA). Neste sentido, nossas projeções contemplam variações de 3,5% e 4,2% para o IGP-M em 2024 e 2025, respectivamente. Já para o IPCA, variável oficial de inflação acompanhada de perto pelo BCB (Banco Central do Brasil), as projeções para o mesmo período são de 4,0% e 3,8%, respectivamente. Com estes patamares e a esta altura, já se pode dizer com alguma convicção que a tarefa do Copom de levar a inflação para o centro da meta no biênio se mostra bastante desafiadora, o que explica a interrupção do ciclo de afrouxamento monetário e a comunicação dura do colegiado em sua última Ata.

Inflação e atividade econômica

De fato, diante desse cenário mais desafiador para convergência da inflação para a meta no médio prazo e a elevada nebulosidade ainda presente, avalio que o Banco Central precisará manter a estabilidade dos juros no atual patamar por período prolongado, com retomada do ciclo de flexibilização monetária apenas na reunião de setembro de 2025, levando a Selic para 9,75% ao final do próximo ano.

Sobre a atividade econômica, apesar do patamar contracionista da política monetária e do juro real elevado, o que temos mapeado sobre os indicadores até o momento vem reforçando nossa perspectiva, tanto a nível trimestral quanto para a visão anual. Sobre o segundo trimestre do ano, os indicadores de serviços e indústria apontam para uma desaceleração da dinâmica doméstica. Além disso, ao conhecermos os dados de maio, que revelarão os impactos do desastre no Rio Grande do Sul de maneira mais clara, devemos ter a confirmação de que o desempenho da segunda passagem trimestral dificilmente alcançará o patamar de 0,5%. Para o restante do ano, contudo, a partir das influências positivas advindas do mercado de trabalho ainda aquecido e uma carteira de crédito total do SFN que deve crescer 11,2% em 2024, mantenho a visão de que o PIB do ano apresentará alta equivalente a 2,2%.

Sendo assim, entendo que vetores mais ligados ao lado real da economia devem se manter resilientes nos próximos trimestres, mas alerto que os movimentos dos ativos nos últimos meses trouxeram um viés mais cauteloso para o restante do ano. Um arrefecimento, mesmo que parcial, na deterioração dos preços dos ativos e variáveis de risco se mostra crucial para que a conjuntura atual não reverbere em danos mais perenes para a economia brasileira nos trimestres à frente, em particular sobre a atividade econômica.

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