Como a taxa de juros afeta as empresas do varejo em bolsa
Por que as ações do setor de varejo, um dos preferidos da pessoa física na Bolsa, são influenciadas pelos juros
Publicado por: Broadcast Exclusivo
5 minutos
Atualizado em
30/09/2024 às 15:27
Por Gustavo Boldrini, do Broadcast
Você já deve ter ouvido falar que o setor de varejo se movimenta na Bolsa conforme o ciclo econômico, mais especificamente em torno das estimativas de alta ou baixa da taxa básica de juros, a Selic. O ICON, índice de consumo da B3, que reúne diversas ações de varejistas e outros segmentos considerados cíclicos, acumulou um recuo de 48% entre março de 2021 e março de 2023, em meio ao aperto monetário provocado pelo Banco Central em busca de controlar a inflação. Agora, a tendência é que o índice se recupere conforme a trajetória de corte da Selic, iniciada pelo BC em agosto.
Afinal, por que a taxa de juros afeta tanto as empresas do varejo e suas ações? Para entender isso, é preciso compreender antes de tudo que o setor de consumo é um setor cíclico. Ou seja, ele está ligado intimamente aos ciclos da economia: quando há crescimento econômico e baixo desemprego, geralmente há um aumento no consumo. Quando há recessão e alto desemprego, acontece o contrário. Além do varejo, outros exemplos de setores cíclicos são as companhias aéreas, as empresas de construção civil e os produtores de commodities, como petróleo, minério de ferro, celulose e insumos agrícolas.
"Todo mundo é consumidor e tem uma opinião sobre as marcas e as empresas. É natural a pessoa se lembrar da experiência de compra com aquela marca, e isso acaba definindo uma decisão de investimento", afirma a analista de varejo do BB BI, Georgia Jorge.
Qual é a relação entre os juros e as ações de varejo?
Os juros são a ferramenta que o Banco Central utiliza para controlar a inflação e funcionam como uma espécie de precificação do dinheiro. Quanto mais altos os juros, a moeda fica mais cara, e as condições para comprar a prazo ou pedir financiamentos e empréstimos se tornam mais difíceis. A alta de juros desestimula o consumo, por isso ajuda a conter a inflação, que muitas vezes é gerada pela alta demanda. O contrário também acontece: conforme os juros caem, as condições de crédito para a população se facilitam, estimulando o consumo.
Quando a taxa de juros se mexe para cima ou para baixo, os agentes econômicos ajustam suas decisões. Durante o ciclo de queda da taxa Selic entre 2016 e 2020, investimentos em Bolsa ficaram mais atrativos, já que a renda fixa estava pagando menos juros. Quando os juros subiram entre 2021 e 2022, os investidores buscaram mais títulos em renda fixa, que remuneram com base na Selic, deixando a Bolsa em segundo plano.
Do lado das empresas varejistas, elas tomam e concedem crédito. As dívidas dessas empresas ficaram mais caras com os juros elevados e elas tiveram de renegociar com instituições financeiras as condições de financiamento para seus clientes, por exemplo, para parcelamento dos cartões de crédito de marca própria. Na ponta do consumidor, ficou mais difícil de pagar o cartão e os boletos, de forma geral, elevando o índice de atrasos de pagamento e a inadimplência. Todo esse cenário acarreta em redução das receitas, o que compromete a lucratividade das varejistas de capital aberto e, consequentemente, faz as ações caírem. Com a queda dos juros, esse cenário tende a ficar mais favorável para as varejistas.
E não é apenas para o mercado à vista que o investidor tem que olhar se está interessado em ações de varejo, como lembra a analista Georgia Jorge, do BB BI. Geralmente, esse setor acompanha os movimentos da curva de juros futuros, onde são negociados diariamente os títulos de Depósito Interfinanceiro (DI) com vencimentos no curto, médio e longo prazo. Os DIs acabam funcionando como uma medida que baliza as expectativas do mercado financeiro para a taxa de juros no futuro. Por isso, pode ser que, com base nas expectativas futuras, uma empresa varejista tenha alta nas suas ações mesmo vivendo um momento complicado.
"Quando o investidor vê as taxas de juros na curva longa caindo, é um sinal de que a taxa de juros deve ficar menor lá na frente. Os analistas vão revisar suas projeções de lucros para essas companhias, esperando resultados mais animadores e melhores retornos, e por isso as ações podem voltar para o radar dos investidores", destaca Georgia Jorge, analista do BB-BI.
O que o investidor precisa saber para investir no varejo
Além de acompanhar a curva de juros e o noticiário sobre a política monetária, a pessoa física que investe no varejo precisa acompanhar dados de atividade econômica, recomenda a analista. "Dados de renda real do consumidor, taxa de desemprego e o noticiário sobre programas sociais como o Bolsa Família são importantes para o setor."
Outra discussão na esfera de governo que influi sobre o varejo é a Reforma Tributária. Segundo a analista, alguns temas que devem ser discutidos são extremamente relevantes para as varejistas, como eventuais mudanças nas atuais regras de incentivos de ICMS e isenções de impostos para investimentos, além das discussões em torno da tributação de plataformas de e-commerce estrangeiras, como as asiáticas Shein e Shopee.
Como o setor de varejo é dividido
O BB BI divide o setor de varejo na B3 e consumo em quatro grupos: saúde e beleza (redes de farmácia, fabricantes de medicamentos e cosméticos); alimentação domiciliar (supermercados e atacadistas); vestuário (lojas e fabricantes de roupas e calçados); e bens duráveis (lojas de departamento).
Além desses setores, os analistas do banco também acompanham as ações da varejista de joias Vivara e da rede de pet shops Petz.
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