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Mercado

Empresas captam mais via debênture incentivada do que bolsa, e volume pode somar R$ 100 bi este ano

Publicado por: Broadcast Exclusivo

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Atualizado em

21/05/2024 às 12:09

Por Cynthia Decloedt

As debêntures incentivadas, títulos de dívida emitidos por empresas e que oferecem isenção de imposto de renda para o investidor, alcançaram enorme popularidade no mercado e caminham para chegar a inéditos R$ 100 bilhões em volume emitido em 2024. Pelo segundo ano seguido, a modalidade deve superar o total captado pelas empresas no mercado de ações.

Até abril deste ano, o total emitido pelas empresas por meio do instrumento já é recorde, somando R$ 32,5 bilhões, de acordo com a Associação Brasileira dos Mercados Bancário e de Capitais (Anbima). Em todo o ano de 2023, as empresas levantaram R$ 67,8 bilhões com debêntures incentivadas, também volume recorde e mais que o dobro dos R$ 31,43 bilhões do ano anterior.

O avanço de ofertas de debêntures incentivadas não deve parar tão já. A percepção de profissionais desse mercado é de que em 2024 as captações de empresas por meio desse instrumento podem beirar os R$ 100 bilhões e novamente bater o mercado de ações.

Para efeito de comparação, as empresas levantaram R$ 31,43 bilhões por meio de ofertas subsequentes (follow on) na B3 em 2023 e R$ 4,86 bilhões até abril deste ano.

"Há muitas transações já contratadas para as próximas semanas e meses e pode ser que o mercado chegue aos R$ 100 bilhões", diz o responsável pela área de emissão de dívida local e internacional do UBS BB, Samy Podlubny. Entretanto, ele acredita que é um número "puxado", dado que representa um crescimento de quase 50% em relação a 2023.

O presidente da Sparta Investimentos, Ulisses Nehmi, afirma que sua gestora trabalha com um número maior de emissões de debêntures incentivadas superior a 2023. "Não descarto que chegue aos R$ 100 bilhões, o qual, embora pareça bastante, é possível já que há muita demanda dos investidores nesse momento", diz.

Entenda: O que é debênture e como investir em dívida corporativa

A perspectiva de a taxa Selic seguir em dois dígitos acentua o interesse dos investidores nesses papéis. A demanda já vinha aquecida desde o segundo semestre do ano passado, diante do fim da isenção de imposto de renda dos fundos exclusivos, um veículo de investimento usado pela alta renda, e que levou os gestores a buscar alternativas. Além disso, no começo deste ano, diminuíram as opções de investimentos no mundo dos incentivados e a bolsa não tem sido opção de investimento.

Prazo de carência

Neste ano, o governo esticou o prazo mínimo de carência para resgate nas alocações em letras de crédito do agronegócio (LCA) e imobiliário (LCI), de 90 dias para nove e 12 meses, respectivamente, deixando ambos papéis menos atraentes. Nos certificados de recebíveis do agronegócio (CRA) e imobiliário (CRI), restringiu o lastro eliminando um grande número de empresas não diretamente com atividade em ambos os setores da fila das emissões.

Relembre: CMN ajusta lastros e prazos de vencimento de títulos incentivados como CRA, CRI, LCA e LCI

Ao regular, no final de março, as novas debêntures de infraestrutura - que tem incentivo fiscal para as empresas emissoras - o governo deixou em aberto pontos que ainda precisam de esclarecimento e afetam as debêntures incentivadas - que têm benefício ao investidor. De toda forma, o governo deu 90 dias de carência para que empresas emitissem debêntures incentivadas seguindo as regras antigas, a qual termina no final de junho. Isso provocou uma corrida das empresas para colocarem de pé suas ofertas. Como resultado, dos R$ 32 bilhões emitidos entre janeiro e abril, R$ 24 bilhões se concentraram entre março e abril.

O gestor de crédito privado da Legacy, Leonardo Ono, acredita que maio será um mês de alto volume de ofertas de debêntures incentivadas, com chances de desaceleração em junho. "A perspectiva, mesmo assim, é de que haja recorde novamente de emissões de debêntures incentivadas este ano, caminhando para R$ 90 bilhões a R$ 100 bilhões", diz ele.

Ao mesmo tempo, enquanto a bolsa não volta, os fundos de renda fixa são os que têm visto aumento constante nas captações. De janeiro a abril deste ano, os fundos de renda fixa acumulam entrada positiva de R$ 151,3 bilhões, contra saídas líquidas de R$ 47,4 bilhões no mesmo período de 2023. Vale lembrar que boa parte desse fluxo foi para fundos conversadores, ou seja, com aplicações em títulos públicos majoritariamente, o que, de qualquer modo não reduz o aumento na demanda para as debêntures incentivadas.

Queda de braço no preço

A busca dos gestores pelas debêntures incentivadas causou outro efeito que foi uma queda nos prêmios que as empresas pagam, acima da taxa de juro de referência - muitas vezes a NTN-B - nas debêntures incentivadas.

Algumas empresas conseguiram ao longo dos últimos quatro meses até emitir sem oferecer ao investidor qualquer prêmio. Mas esse jogo mudou e agora investidores tem deixado de comprar o total das ofertas de debêntures incentivadas, obrigando os bancos a ficar com o restante dos papéis em algumas das recentes operações que vieram ao mercado.

Um caso recente é de uma emissão de R$ 1,4 bilhão da Energisa, em três séries, duas delas com remuneração somente das NTN-Bs, também chamado no jargão do mercado de "B careca". A terceira série tinha prêmio de 0,15% acima da NTN-B, que também não convenceu os investidores.

Conforme dados da colocação disponíveis na Comissão de Valores Mobiliários (CVM), cerca de R$ 1,2 bilhão ficaram com instituições financeiras ligadas à emissão. Na semana passada, a Suzano anunciou captação de R$ 5,9 bilhões com debêntures em três séries, sendo a terceira de R$ 900 milhões incentivada, com remuneração "B careca".

Essas emissões que estão sendo rejeitadas são de empresas de primeira linha, ou seja, que normalmente oferecem menores prêmios, e que foram contratadas com garantia firme de colocação há cerca de um mês e meio a dois meses atrás. Além do "B careca", algumas chegaram ao mercado com prêmios entre 0,5% a 0,15% acima do juro de referência.

"Há uma racionalidade bem grandes dos gestores nesse momento, que não estão aceitando prêmios muito baixos, apesar de haver interesse e muitos recursos para serem alocados", diz Nehmi, da Sparta.

Segundo ele, vários gestores estão nesse momento optando por comprar debêntures incentivadas no mercado secundário. Nehmi afirma que um prêmio mínimo superior a 0,30% é necessário para atrair gestores para papéis de maior rating. "Há um certo desequilíbrio nesse momento", diz Podlubny, do UBS-BB. Segundo ele, os prêmios têm de estar alinhados aos fundamentos e isso já está acontecendo, ou seja, "o mercado está se ajustando".

  • Ono, do Legacy, acha "ótimo" que o mercado esteja mostrando racionalidade, forçando maior disciplina nas novas precificações.

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